Mais do que uma colectânea de testemunhos, episódios, reflexões, poemas, de quem conviveu de perto com Zeca Afonso e Adriano Correia de Oliveira, “Provas de Contacto” pretende reflectir esse espírito de fraternidade, de partilha, e a amizade que tem unido todas as entidades e pessoas a título individual em torno destes dois seres maiores da música e da intervenção cívica. Por participarem “nas causas em que acreditavam, sempre com espírito de solidariedade, de generosidade, da vida colectivamente partilhada”, achamos que este livro deverá assumir essa atitude de exemplo de cidadania e servir de incentivo para todos aqueles que defendem as causas da liberdade e da dignidade humana.
6ª feira, 17 de Agosto, 21h30m
1- CRISTINA BRIONA – “Stand up Comedy” desátira social | Música (Matosinhos)
2- ANA RIBEIRO | ANA AFONSO | HELENA SARMENTO – música e palavra de José Afonso, Adriano Correia de Oliveira e outros (Porto)
Sábado, 18 de Agosto, 21h30m
1- GENTE DO “CANTO D´AQUI” – Música Tradicional Portuguesa e de José Afonso e Adriano Correia de Oliveira (Braga)
2- MANOLO BACALLAU – Música Tradicional Galega e canções de José Afonso (Ferrol, Galiza)
Esta iniciativa enquadra-se no convite recebido do CÍRCULO DE ARTE E RECREIO (Guimarães) subscritor deste projecto.
por Moisés Cayetano Rosado
Para gritar
se escogió tu guitarra
y a ese pueblo camino de la mar,
al borde de la dura
planicie alentejana,
sol naciente
rompiendo con la escarcha y los cristales
brumosos de la noche prolongada,
de la noche extendida como cieno, losa infame,
oprobio y calentura, tiranía.
“Grândola, vila morena,
terra da fraternidade”.
Tierno cantor de rama empecinada,
recio cantor de flores en las manos,
legendario juglar rico, repleto
de sueños, de utopía,
suave amor
de gotas de rocío
temblando en los claveles.
“O povo é quem mais ordena
dentro de ti, o, cidade!”.
Dentro de ti, corazón
abierto como playa
de niños, gaviotas, inquietas golondrinas.
Entregada guitarra, generosa
voz
sin condiciones
para aquél que reparte las espigas,
descorre las cortinas empolvadas, hace fuego
para manos temblantes, ateridas.
“Em cada esquina um amigo,
em cada rostro igualdade”, en cada mano
la esperanza sangrante de claveles
rebosantes de lágrimas, repletos
de llantos de alegría.
De abrazos aplazados.
Y allí,
como una antigua, legendaria,
heredada promesa,
“a sombra de uma azinheira
que ya não sabia idade
jurei ter por companheira
Grândola tua vontade”.
Sacrificado pueblo, lacerados hijos
sacados a luchar con la locura,
juró el cantor, juraron todos,
cortar con las cadenas,
cortar con la acerada
mirada del rencor
y buscar
el calor de las manos, los brazos fraternales,
a un lado y otro
del mar teñido con la sangre,
de los mares teñidos con el odio.
La voz, aquella voz,
que muchos después
-¡ay!- ignoraron,
fue la clave del nuevo despertar,
el arma sin pólvora ni plomo,
la luz de Abril, gozoso
compás de la alborada.
(in SIEMPRE ABRIL)
Ao longo do ano 2012, na última quinta-feira de cada mês, a Taberna Svbvra em Braga tem dedicado a noite à música do Zeca e do Adriano. Esta iniciativa que baptizámos como: “Viagem pela memória, Adriano e Zeca, a música e as palavras”, destina-se, não só a celebrar a obra destes dois amigos, mas também a “apresentá-la ao público menos familiarizado com os seus trabalhos. Para isso estamos a fazer uma “Viagem”, em termos cronológicos, ao longo das suas obras; apresentando um conjunto de músicas diferentes todos os meses. Afim de divulgar textos menos conhecidos em cada mês escolheremos também um poema do Zeca ainda não musicado e a partir deles criaremos uma música original.
Aí está mais uma dessas quintas-feiras; junta-te a nós para ouvir, tocar e cantar as musicas e as palavras!
SAUDAÇÃO E MEMÓRIA
De Rui Namorado
a boémia bebida gota a gota com raiva
a boémia sorvida alegria tão breve
era então que nos ríamos do que havia de ser
uma casa cercando o bolor destes anos
o emprego roendo gota a gota levando
o que resta no fundo dessa larga memória
era então que aventura
era estar devagar nessa curva do tempo
onde a areia mais leve se perdia entre os dedos
dia a dia fugindo ansiosa e suave
era então que nos ríamos devagar sem saber
desta náusea futura que ainda havia de ser
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Na secreta raiz de algum poema
tu nasceste por dentro das palavras.
Cantar era para ti uma viagem.
Sentias a revolta, nervo a nervo,
como um pássaro ferido.
Neste tempo rasteiro e abafado,
guardavas o veneno precioso.
Ias para longe de mais e o tempo passa:
os milhafres do nojo prosseguiam,
rasgando a carne pura do teu sonho.
Matavas o silêncio.
Mas na sombra do tempo houve uma pausa,
um outono mais rápido,
um inverno mais súbito.
E as pétalas da noite desabaram,
corroendo o teu nome de grinaldas perdidas.
Pergunto ao vento que passa
notícias do meu país
e o vento cala a desgraça
o vento nada me diz.
Pergunto aos rios que levam
tanto sonho à flor das águas
e os rios não me sossegam
levam sonhos deixam mágoas.
Levam sonhos deixam mágoas
ai rios do meu país
minha pátria à flor das águas
para onde vais? Ninguém diz.
Se o verde trevo desfolhas
pede notícias e diz
ao trevo de quatro folhas
que morro por meu país.
Pergunto à gente que passa
por que vai de olhos no chão.
Silêncio — é tudo o que tem
quem vive na servidão.
Vi florir os verdes ramos
direitos e ao céu voltados.
E a quem gosta de ter amos
vi sempre os ombros curvados.
E o vento não me diz nada
ninguém diz nada de novo.
Vi minha pátria pregada
nos braços em cruz do povo.
Vi minha pátria na margem
dos rios que vão pró mar
como quem ama a viagem
mas tem sempre de ficar.
Vi navios a partir
(minha pátria à flor das águas)
vi minha pátria florir
(verdes folhas verdes mágoas).
Há quem te queira ignorada
e fale pátria em teu nome.
Eu vi-te crucificada
nos braços negros da fome.
E o vento não me diz nada
só o silêncio persiste.
Vi minha pátria parada
à beira de um rio triste.
Ninguém diz nada de novo
se notícias vou pedindo
nas mãos vazias do povo
vi minha pátria florindo.
E a noite cresce por dentro
dos homens do meu país.
Peço notícias ao vento
e o vento nada me diz.
Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça
há sempre alguém que semeia
canções no vento que passa.
Mesmo na noite mais triste
em tempo de servidão
há sempre alguém que resiste
há sempre alguém que diz não.
Manuel Alegre